Seja a referência negra que você procura
Escrito por Andressa Santiago - novembro 04, 2017
Aqui estou eu:
uma jovem de 19 anos, negra, fora dos padrões da sociedade, negra, sonhadora,
negra, capaz, negra, que acorda com um brilho nos olhos, negra, convicta todas
as manhãs de avançar e prosseguir, negra, impedindo que olhares e
questionamentos negativos me tirem o orgulho de ser, negra, eu.
Deixando meus dedos e pensamentos me
conduzirem, acabo de perceber que, “negra” soou tão repetitivo quanto
soa todas as manhãs em minha mente, ao abrir os olhos, me deparar com o meu eu,
me maquiar, porém, sem tentar me esconder, sem parecer “exótica” como muitos me
vêem, ou melhor, vêem os negros.
Arrumo-me, me
visto de orgulho, simplicidade, veracidade, sorriso, ousadia e perseverança,
buscando assim uma perfeita harmonia entre o meu eu e minha cor. Minha pele, minha origem!
Vejo-me
pronta, pronta para por os pés na rua e, de cabeça erguida, ser mais. Mais que
olhares negativos, julgadores, superiores, discriminadores e penosos.
Busco
referência, e maior parte das que encontro não são negras; e então busco ser a
referência: da pele escura, do cabelo afro, lábios grossos, olhos castanho
escuro. A referência que nunca tive e que apesar de toda revolução, ainda hoje, se encontra escassa.
Quando
criança, desejava ser branca, ter cabelo escorrido, olhos azuis, e apesar de
hoje a menção a igualdade racial, negritude, diversidade e empoderamento esteja
em foco, faz com que algumas vezes até pensemos que: “Estamos sendo vistos, não
como coitados, como inferiores e/ou submissos. Os adolescentes e crianças
negras hoje não vivenciarão interna e externamente o que nossos antepassados
viveram e/ou vivemos”. OK, tivemos um grande avanço! Mas, apenas no início
do mês 10/17 pude perceber que infelizmente não podemos generalizar.
Vivenciei e ouvi o negro sendo colocado abaixo de outras raças.
Isso
provavelmente é muito difícil de ser compreendido:
“Nossa, você está tão estilosa hoje! Tenho uma filha (de consideração) igual a você, vou te mostrar a foto dela – mostrou a foto para todos presente no local, e disse: Eu sambo, ela não; sabe, eu tenho inveja ao contrário, acho lindo seu cabelo, sua cor. Você acredita que as mulheres negras não gostavam de me ver – num evento que engloba cultura negra – dançando junto com elas, e então eu parei de ir, me sentia o centro das atenções, excluída, até mesmo indesejada”. Disse-me uma mulher branca.
“Sabe o que minha filha me disse hoje? Disse que queria ser branca, que não gostava do cabelo dela (cacheado) e queria ser igual ao amigo mais próximo, de olhos azuis. Você acredita? Então eu perguntei a ela: De que cor eu sou? Ela levantou os ombros, e então eu disse: Eu sou negra e você é linda assim, do jeito que é, sua cor, seu cabelo e seus olhos não precisam ser igual ao amigo”. Disse-me a mãe de uma criança de apenas quatro anos.
Esses dois
pontos me fizeram refletir sobre o quanto já lutamos e precisamos lutar. Até que os
olhares superiores sejam a minoria, e a “inveja ao contrário” não seja dita. Até
que não haja motivos para achar que os negros sentem inveja de outra raça. Até
que uma criança não cultive dentro de si, o desejo de não ser quem é (questione-se porquê). Até que a
raça não diga se você deve saber sambar ou não – “porque está no sangue”. Até
sermos tratados como parte integrande de uma sociedade, mesmo sendo a minoria em determinados locais, assim como os não negros querem ser recebidos em nosso meio, em
nossa cultura. Até lá, lutaremos!
Convido você a ser também a referência procurada e encontrada. Representando, explorando, empoderando... E isso não é somente para negros, como eu, isso é para todos que desejam ver diversidade.
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Obrigada pela participação, responderei em breve.
Andressa Santiago