Ela era excluída por ser diferente, ou era diferente por ser excluída?

Esse romance de formação, narra a história de Kya, que aos seis anos de idade, mesmo sem saber ler, aprendeu o significado da palavra abandono. Sua mãe — cansada de ser constantemente agredida pelo marido —, deixou os filhos e embora seu intuito fosse voltar para buscá-los, foi ameaçada. Seus irmãos, pela mesma forma. Por fim, restou seu pai e ainda que tivessem bons momentos juntos, deixava maior parte do dinheiro nas bebidas e retornava quando bem entendia, até que — como ela esperava — também não voltou. Eles a tinham abandonado para sobreviver e se defender. Então ali estava ela, sozinha.

O contexto social se faz presente em diversos momentos. Bem como a situação da protagonista por viver em condições precárias e tentativas falhas de se incluir na sociedade ao ser estereotipada e excluída. Além disso, aborda assunto como a segregação e o racismo, desigualdade de gênero e social. Desse modo, a experiência de Kya na cidade foi hostil.

Aos dez anos, sua tentativa de ir para a escola foi frustrada, e mesmo tão nova aprendeu como ganhar o próprio sustento com a ajuda provida pela natureza do pântano onde morava. Nas poucas vezes em que ia até à cidade para trocar seus mariscos por mais mantimentos fez um casal de amigos, e a relação entre ambos era fraternal — principalmente quando esteve incluída em uma investigação criminal.

A narrativa alterna entre a evolução de Kya e seu julgamento por um crime misterioso ocorrido no pântano. Essa dinâmica do livro mantêm o leitor interessado no rumo que a vida da protagonista irá tomar.

Sua família a abandonou a própria sorte para sobreviver no pântano, entretanto, havia alguém que ia até seu barracão para lhe deixar penas raras, e esse alguém era Tate. Ele teve um lugar especial em sua vida e foi complacente. Ensinou-a a ler, escrever e foi fundamental na concretização de um lindo sonho que nasceu de sua solidão. 

As más experiências na cidade fizeram com que Kya fugisse sempre que houvesse a possibilidade de contato humano. Por esse motivo, não frequentou a escola e só ia à cidade de Barkley Cove para buscar mantimentos e visitar o casal de amigos que fez.

A relação dela com Tate é pura, honesta, respeitosa, amigável e amável. Apesar de ter problemas, como em qualquer relacionamento, havia uma certeza reconfortante e uma capacidade de superação motivadora. Ainda que a narrativa não seja em torno desse romance, pois foca no desenvolvimento pessoal de Kya.

Como se não bastassem todas as experiências duras que viveu, Kya foi presa por dois longos meses sem direito a fiança. Primeira detenta mulher em anos, e sobretudo com risco de receber pena de morte. O que não acontecia no condado há duas décadas. Aceitava ver apenas Jodie — seu irmão que havia voltado —, e seu advogado. Kya foi acusada de algo gravíssimo e, por sorte, conseguiu a empatia inesperada de um advogado experiente.

“A menina do brejo”, como era conhecida, colecionava penas e as catalogava, hobby que evoluiu para conchas e tudo que incluía a natureza. Com o tempo passou a desenhá-las usando giz ou aquarelas. Seu amor pelo brejo fez dela uma autora e bióloga premiada, sendo, desde então, a Catherine Danielle Clark. Grande reconhecimento e respeito para quem um dia foi excluída da sociedade severamente.

Além de escritora, Delia Owens é cientista e frequentemente discorre sobre a natureza com muita propriedade e clareza, sobretudo de modo poético. É apresentado descrições sobre o pântano e tudo o que nele vive. Se, assim como eu, você gosta de observar a natureza ou deseja criar esse hábito, essa leitura é uma grande oportunidade de conhecer animais exóticos.

Após publicar os livros, ela arrumou e legalizou o barracão, ninguém poderia tirá-la do que sempre foi seu lar. Desenvolveu uma afinidade com o pântano e com ele conquistou uma vida digna. Contudo, sua finalidade sempre foi proteger a natureza que vinha sendo alvo de extinção. Frequentemente recitar poemas de Amanda Hamilton, pois era uma forma de exteriorizar o que estava sentindo.

A leitura foi fluida e contém poemas — a poeta me pegou de surpresa e se é daqueles que pesquisa enquanto lê, prepare-se. O final tem muitas, MUITAS, reviravoltas. Como assim termina o livro e me deixa com essa?!

  Título Original: Where the crawdads sing

  Autor: Delia Owens

  Gênero: Drama / Ficção / Literatura Estrangeira

  Páginas: 336

  Edição: 1ª Edição

  Editora:  Intrínseca

  Publicação: 2019

  ISBN:  9788551004869

  Minha avaliação: ★★★★★

Sinopise:
Fenômeno editorial, com mais de 2 milhões de cópias vendidas, Um Lugar Bem Longe Daqui figura nas listas de best-sellers dos Estados Unidos desde seu lançamento original, em agosto de 2018.
Por anos, boatos sobre Kya Clark, a “Menina do Brejo”, assombraram Barkley Cove, uma calma cidade costeira da Carolina do Norte. Ela, no entanto, não é o que todos dizem. Sensata e inteligente, Kya sobreviveu por anos sozinha no pântano que chama de lar, tendo as gaivotas como amigas e a areia como professora. Abandonada pela mãe, que não conseguiu suportar o marido abusivo e alcoólatra, e depois pelos irmãos, a menina viveu algum tempo na companhia negligente e por vezes brutal do pai, que acabou também por deixá-la.
Anos depois, quando dois jovens da cidade ficam intrigados com sua beleza selvagem, Kya se permite experimentar uma nova vida — até que o impensável acontece e um deles é encontrado morto.
Ao mesmo tempo uma ode à natureza, um emocionante romance de formação e uma surpreendente história de mistério, Um Lugar Bem Longe Daqui relembra que somos moldados pela criança que fomos um dia e que estamos todos sujeitos à beleza e à violência dos segredos que a natureza guarda.
A obra foi incluída no clube de livros de Reese Witherspoon, que posteriormente adquiriu os direitos de adaptação cinematográfica e vai produzir o filme com a Fox 2000.